quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Outro comentário do público enviado para mim:

E aí senhor diretor...

Tenho um diário pessoal que não publico. Mas colei aqui parte do que escrevi ontem para dividir contigo, já que tu pareceste interessado nas opiniões dos espectadores do teu trabalho. Então...

Qui - 23/09/10: Hoje fui assistir com ... a peça 'Homem Que Não Vive da Glória do Passado', dirigida e protagonizada por João de Ricardo. Cheguei no Túlio Piva com uma expectativa bem ruim, já que o que li a respeito da peça indicava que o trabalho se sustentava apenas através de sentimentos, digamos, expostos e não teria muito significado em termos de texto. Apesar de eu estar totalmente aberto a experiências sensoriais (ainda mais depois da experiência de ver o filme 'Os Famosos e os Duendes da Morte'), sempre corro o risco de simplesmente não sentir absolutamente nada, se o diretor (ou o autor ou o interprete, que nesse caso são a mesma pessoa) não conseguir passar essas sensações (e eu sinto esse risco mais evidente no teatro do que no cinema, já que as técnicas envolvidas em captação de imagem sempre ajudam nas sensações provocadas). Mas não. O texto é bem interessante também e traz várias reflexões. Além de toda a parafernália sensorial envolvida ser realmente provocadora, a degustação da obra pode ser cerebral também. O cara consegue provocar reflexões pesadas e depois, num mesmo momento, aliviar tudo, através de ironia e humor.

Várias reflexões surgiram em mim: o que é a consciência do próprio ser; essa consciência estaria ligada a um looping de rotina de vida; o que nos define como conscientes e, portanto, nos diferencia dos outros seres que habitam a nossa realidade; novamente a reflexão a respeito dessa realidade alterada a partir da presença do observador; a importância da co-dependência existencial e os momentos em que devemos (ou podemos) nos desprender disso; os vícios das sensações que acabam sendo o alívio das almas atormentadas (desde a busca neurótica pelo sucesso até a sensação tão boa provocada pela ingestão de um simples Nescauzinho, que eu adoro); e a reflexão mais óbvia, mas não menos interessante, que tenho desde criança - o que aconteceria com os homens se absolutamente todas as mulheres do mundo simplesmente desaparecessem? Tive diversas outras reflexões-relâmpago e sensações que ficaram na fila do cérebro a fim de serem processadas, mas não deu tempo porque o cara é realmente rápido no gatilho da sua "arma para obter o sucesso".

É lógico que eu normalmente prefiro trabalhos que esmiúce mais sentimentos específicos e que sejam interpretados por atores que se mostrem verdadeiramente impregnados por aquele outro ser que aparentemente não reflete em nada a sua vivência pessoal (mesmo sabendo que isso é uma ilusão... a bela ilusão). Mas não posso deixar de confessar que o trabalho do cara me surpreendeu exatamente por não ser o tipo de trabalho que normalmente aprecio.

Evan Godoy

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